domingo, 17 de junho de 2012

UM HOMEM SEM FÉ !


Meu nome é Maria Tereza, minha família mora no Brasil desde 1930. Meus bisavós paterno e materno vieram de Portugal no mesmo navio.
Meus avós paternos construíram sua vida na cidade de São Paulo e meus avós maternos no Rio de Janeiro. Ambas as famílias mantiveram contato surgindo assim uma grande amizade que teve inicio a bordo do navio.
Meus avós sempre foram muito religiosos, tementes a Deus. Com o laço de amizade surgiu, depois de anos o amor entre meus pais. Minha mãe muito religiosa, sempre com o nome de Deus em sua vida, mas, meu pai se dizia ateu, para o desespero de minha mãe.
Quando ele a pediu em casamento deixou claro que só casaria no cartório e ela recusou o pedido.
Todos da família trabalhavam muito, a familia do meu pai em padaria e a família de minha mãe num mercado. E com anos de trabalham conseguiram prosperar e construir uma rede de padarias.
Durante muito tempo meu pai insistiu com minha mãe para casarem só no civil, mas vendo que ela não aceitava ele resolveu casar-se na igreja com receio de perdê-la.
Casaram-se em São Paulo no dia 10 de janeiro de 1955 e minha mãe tinha a esperança que meu passaria a acreditar em Deus.
Sou a filha mais velha e tenho mais três irmãos: Maria Isabel, João Manoel e Pedro Antonio. Trabalhávamos muito, meu pai ia trabalhar às quatro horas da manhã e minha mãe ia para padaria depois que íamos para o colégio. A vida era prospera e aos domingos íamos à igreja, exceto meu pai.
Num sábado à noite ouvi meu pai dizer para minha mãe:
- Não vou à igreja, não sei o que fazem lá, se Deus existisse o mundo não seria assim, se eu não trabalhar nada cai do céu.
- Meu marido se trabalhamos é porque Deus nos abençoa todos os dias, alguém superior a você e a mim nos criou.
- O mundo existe por um acidente, eu e todos somos um acidente, não existe nada além da morte, viramos esqueletos e pó com o tempo, então me deixe trabalhar para te um caixão digno.
Minha mãe chorava muito, orava e pedia perdão, diversas vezes pensou em deixa-lo, mas, amava-o e desistia dessa ideia. Eu e minha irmã estudamos somente o primeiro grau e fomos trabalhar na padaria, mas, papai ainda não nos deixava ir à igreja no domingo.
Aos dezenove anos me casei com Armando que trabalhava na farmácia com o pai dele e continuou os estudos depois de casado.
Casamos-nos no dia 23 de junho de 1976, na igreja e no civil, foi uma festa linda, toda família do Rio e de São Paulo estava presentes, mas, meu pai não olhava para o altar.
Os pais dele estavam entristecidos e diziam que ele sempre fora assim.
Com um ano de casada engravidei do meu filho Armando Junior, no batizado meu pai só compareceu no almoço. Nos natais em família ele só comia e bebia e só falava de trabalho e minha mãe sempre aconselhando, tentando fazê mudar de atitude.
Até que em maio de 1978, numa das conversas com minha mãe ele rasgou as duas bíblias da casa e as incendiou. Minha mãe teve um derrame e ficou internada por vinte dias, achamos que ela ia morrer. Nos, os filhos estávamos desesperados e meu pai irredutível.
Neste dia sai do hospital e fui falar com meu pai na padaria, fomos até o escritório.
- Pai, se a mamãe morrer é por sua culpa, o senhor está perdido, respeite as pessoas.
- Maria Tereza me respeite, sou seu pai!
- Como respeitarei se não respeitou minha mãe e a fé dela?
- Você esta falando de Deus, por culpa Dele sua mãe está no hospital.
- Não pai! Olhe-se no espelho, foi o senhor que a levou para o hospital. Deus lhe deu tudo e um dia eu o verei clamar por Ele.
- Isso nunca acontecerá, eu só acredito no trabalho.
- Pai tenho pena do senhor. Há um vazio em sua alma que tenta preencher com trabalho.
O que aconteceu para o senhor pensar e viver assim?
- Se Deus existisse não haveria doenças, maldades e guerras. Onde está o paraíso prometido por Ele?
- As maldades são frutos das ações dos homens e o paraíso está dentro de nós, por mais difícil que seja uma situação sempre há esperança. O senhor que é desprovido de esperança.
Fui embora com o coração apertado. Minha mãe teve alta e foi para minha casa até recuperar-se totalmente, meu pai ia vê-la todos os dias.
Depois de dois meses minha irmã casou-se com Luiz Felipe e novamente houve discussão entre ele e minha mãe. Em 1980 eu tive minha filha Maria Augusta e minha irmã teve Maria Cristina para alegria da família.
Meus irmãos estudavam e trabalhávamos com papai, nós as mulheres não podíamos estudar porque papai achava que as mulheres devem trabalhar com os pais e casar-se.
João Manoel formou-se advogado e casou-se no mesmo ano com Gloria sua amiga de faculdade. No casamento da igreja foi mais fácil para papai, mas, Pedro Antonio conversou muito com papai para convencê a ficar no altar.
Pedro Antonio foi o único da família que seguiu a profissão de papai e agora tínhamos quatro padarias. Ele namorava Carina, uma moça meiga e doce e começou a frequentar mais nossa casa. Ela e a família acreditava que a vida continua depois da morte e orientava meu irmão. Mas quando meu ouviu esta conversa em casa ele explodiu.
-Vocês querem que eu acredite nestas besteiras? Não quero mais ouvir este assunto aqui em casa.
-Pai Deus existe! Ele está dentro de mim e de você, põe a mão no coração e escute o som do seu coração, é o som da vida, o som de Deus. O corpo humano é perfeito. A natureza é bela, olhas seus netos como são lindos. Deus está dentro de nós, Ele é a vida. Eu acredito que a morte é só a passagem para outro tempo, para o mundo de Deus. Disse Pedro Antonio.
-Me diz se você conhece alguém que voltou do mundo dos mortos?
- Conheço sim pai!
- Quem? O vizinho que morreu há seis meses?perguntou meu pai ironicamente.
- Não pai, conheço Nosso Senhor Jesus Cristo que foi enviado por Deus. Ele foi crucificado, morto e ressuscitou e no terceiro dia subiu aos céus para o reino de Deus. Ele é o milagre do amor, Deus Pai e Filho, desceu a mansão dos mortos e ressuscitou para que homens como o senhor não pudessem falar e julgar a existência de Deus, a existência de Jesus Cristo. Paizinho creia que Ele vai tirar essa escuridão da sua alma.
- Escuridão? Só se eu não pagar a conta da luz meu filho.
- Pai pessoas como você diz e insiste em negar Deus, porque temem e sabem que temos Alguém Divino superior a nós. Deus é Amor, mas, se Ele achar melhor dará um basta nas maldades humanas. E eu te pergunto:
- Porque que crianças morrem cedo seria injusto? É que essas crianças já aprenderam a lição de Deus ou trouxeram uma mensagem para aqueles que necessitam.
- Pare! Pare! Isso é tudo bobagem! Retrucou meu pai com aspereza.
- Paizinho, nos te amamos e Deus sabe que o senhor é um homem honrado, mas peço ao Senhor Pai que eu seja um instrumento Dele em sua vida.
Ficamos apavorados e minha mãe exclamou:
- Meu marido olha o que seu filho esta dizendo!
Ele se retirou da sala e foi descansar, estávamos cansados e minha mãe com pressentimentos ruins.
Depois de quinze dias, meus tios, numa viagem de carro, a caminho de São Paulo sofreram um acidente. Meus tios ficaram feridos e meus avos paternos que estavam
carro morreram na hora. Fomos ao enterro, todos muito abalados meu pai não demonstrava nenhuma emoção. Minha mãe dizia que ainda sentia um mau pressentimento, demos-lhe chá calmante para ela, por fim acalmou-se.
A vida voltou ao normal, meu irmão Pedro animou-se e pintou as padarias e nos fizemos uma faxina geral. Ele tinha planos, já se aproximava o dia do seu casamento com Carina. A padaria que ele cuidava mudou-se para uma grande avenida. A caminhonete com as mercadorias chegou e parou do outro lado da avenida e Pedro foi ajudar descarregar. Quando um caminhão o atropelou, ele foi jogado longe, meu pai vinha chegando na hora e assistiu o acidente. Todos correram e quando meu pai chegou onde estava Pedro, percebemos que ele não respirava, papai colocou a mão em seu peito então não sentiu osbatimentos cardíacos. Desesperou-se ajoelhou no chão e começou a gritar:
-Não! Não! Deus! Deus! Se existes não deixe meu filho morrer! É um pai Te pedindo! Deus! Deus! Ouça-me.
Na grande avenida meu pai ajoelhado com as mãos na cabeça, desesperado pedindo socorro a Deus.
- Deus me leve, tenha piedade do meu filho.
Minha mãe ficou parada na porta da padaria, chorando, sem ter forças para andar. Ela disse apenas:
- Senhor que seja feita a Sua vontade! Mas, dava pena vê-la em suas lagrimas.
A ambulância chegou e Pedro foi levado ao hospital praticamente morto. Os médicos pediam calma para a família, mas, o estado dele era muito grave. Depois de quarenta e oito horas meu irmão continuava em coma e sabíamos que ele tinha fraturado a coluna, se sobrevivesse ficaria paraplégico.
Após setenta e duas horas os médicos disseram que ele estava fora de perigo de morte. Todo esse tempo meu pai dizia alguma coisa baixinho, não entendíamos o que era.
Três meses depois meu irmão já estava no quarto, mas não mexia as pernas e Carina o tempo todo ao seu lado. Depois de seis meses ele teve alta e foi para casa numa cadeira de rodas, no dia que seria seu casamento. Mesmo em tratamento e sem poder andar ele não perdia a alegria em viver.  Passado dois meses meu pai chegou a casa e chamou todos e pediu que fizéssemos um jantar especial e durante o jantar meu pai levantou-se e perguntou ao meu irmão e Carina se queria casar-se. E os dois surpresos aceitaram.
- Eu fui à igreja e marquei o casamento de vocês para daqui dois meses, agora vocês marquem o civil.
Todos nós ficamos espantados e minha mãe abraçou meu pai. E Maria Izabel aproveitou e perguntou a papai;
-Papai o que você dizia baixinho no dia que Pedro estava no hospital?
- Eu dizia: Deus! Tende piedade do meu filho! E Ele teve Maria Izabel.
Nós o abraçamos era o começo de uma nova etapa da vida para todos. Pedro e Carina casaram-se e meu pai estava no altar, serio, mas sem cara feia. Eles deram para meu pai um presente, uma bíblia nova, dizendo:
- Papai não é para rasgar!
Depois de três anos eles adotaram João Vitor, moreninho, cabelinho encaracolado, com um ano de idade. Ele conquistou o coração de todos, principalmente do meu pai, ele o levava ao parquinho e tudo que fazia era para o menino. Às vezes minha mãe chamava-lhe a atenção porque tinha  outros netos.
Um dia cheguei da padaria e meu pai veio me contar que tivera um sonho com João Vitor adulto com roupas antigas e tirava-lhe de um lugar escuro onde ele ouvia gritos apavorantes. E João Vitor lhe dizia:
-Não ouça os gritos, ouça o som da vida, o som do coração!
- Foi isto que Pedro me disse algum tempo atrás! Disse meu pai.
- Papai será que o senhor e João Vitor já se conheciam?
-Como? Ele tem apenas dois anos?
- Papai estou falando de outro tempo? Em outra vida? Disse Pedro.
- Eu não entendo nada sobre isso! João Vitor me faz feliz, amo todos os meus netos, mas ele é especial.
Depois de uma semana veio meu pai relatar outro sonho:
- Maria Tereza eu sonhei que estava me afogando e um homem me salvou e eu agradeci e perguntei o nome dele. E ele respondeu!
-Meu nome é Francisco, não se esqueça do meu nome e de mim.
Quando João Vitor completou quatro anos, Pedro e Carina adotaram outro menino de três anos, moreninho com poucos cabelos e chorava muito.
Quando a família chegou com o menino, estávamos todos a espera.
- Aqui está nosso filhinho Francisco.
- Filhinho não chore você está bem e todos estavam esperando por você Francisco.
Disse meu pai pegando o menino no colo. Francisco parou de chorar e abriu um lindo sorriso.
No aniversário de quatro anos de Francisco, meu irmão João Manoel e sua esposa resolveram adotar uma criança.
Dois dias depois do aniversário, meu pai tivera outro sonho:
- Eu sonhei que tinha uma carroça com muitos pães e passei de fronte uma casinha e ouvi choro, desci da carroça e fui até lá, era uma mãe com sua filhinha no colo e as duas choravam de fome. Fui até a carroça e peguei os pães e dei-lhes para que comessem e parasse de chorar.
Quando olhei para trás havias muitas pessoas com as mãos estendidas pedindo pão.
Dei-lhes tudo que havia na carroça. Disse meu pai emocionado.
Minha ouviu e leu para meu pai a passagem que Jesus multiplicou os pães, e disse que ela achava que isto significava caridade.
Pedro e Carina concordaram e achavam que a mãe talvez seja a “fé” e a menina “a esperança”.
-Elas me disseram seus nomes, a mãe chamava-se Ana e a filha Sofia. Disse papai.
- Papai, Sofia quer dizer sabedoria divina, e Ana é o nome da mãe de Maria, Mãe de Jesus.
- Acho que algum modo Deus está enviando mensagens ao senhor, Ele está mostrando a fé, esperança e caridade. Disse gentilmente Carina.
-Preciso pensar disse papai.
- Marido, somos padeiros!  E o que tinha na carroça eram pães, é o que fazemos.
- Talvez mamãe, disse Pedro, seja para doarmos um pouco sabemos fazer, pães, há entidades que precisam de socorro, vamos pai ainda a tempo de ajudar.
-Aqui perto há um hospital que precisa de ajuda e eu irei até la ver se podemos ajudar.
No mesmo dia mamãe voltou contente, doaria cem pães todos os dias.
Cada padaria nossa fazia o mesmo e cadastramos famílias que mais precisavam e todas as manhãs recebiam pão quentinho. Todos nós começamos a fazer esse trabalho e depois de um ano tínhamos uma lista considerável de famílias cadastradas.
Depois de um ano, meus irmãos Maria Isabel e João Manoel distribuía sopa à noite para aqueles que nos estendiam as mãos. E até hoje fazemos isso.
Seis meses depois João Manoel e Gloria receberam o telefonema que havia duas irmãzinhas órfãs, a mais velha de seis anos e mais nova de dois anos. Oramos muito e meu pai falava baixinho.
Quinze dias depois, conseguiram a adoção e foram correndo busca-las. Recebemos as meninas com muita ansiedade, segurando a mão de João estava Ana a menina mais velha e no colo de Gloria, Sofia a menor.
Meu pai chorou, abraçou as meninas com carinho. Todos ficaram emocionados, entendemos que Deus estava enviando anjos para salvar meu pai, a família e a você, meu irmão que está lendo.
Meu pai estava sereno, mais calmo, parecia aliviado.
E após dois anos ele teve um enfarto enquanto dormia e morreu já com certa idade. Meu pai passou por fases humanas da descrença, desconfiança, lagrimas e da dor, do amor e da caridade.
Todos no bairro estavam no funeral, na missa a igreja ficou lotada, porque todos por mais que sejam humanos imperfeitos ou quase perfeitos necessitam de orações.
Depois de dois meses da partida dele, João Vitor disse sonhou com o vovô e que ele estava brincando com muitas crianças.
Em fevereiro de 1997 eu parti com câncer no pulmão, não sabia que estava doente, quando descobri não havia mais nada a ser feito. No dia que parti via meu pai sorrindo, achei que era um sonho. Acordei com uma linda jovem ao meu lado sorrindo e  entendi o que tinha acontecido e perguntei a ela:
- E o que será agora?
- Minha querida agora é o sempre, você continuará a viver sem doença.
- E meu pai? Ele está aqui?
- Levante-se com calma, respire o ar puro de Deus, vamos caminhar.
De longe vi um senhor conversando com um grupo de pessoas, cheguei mais perto e vi meu pai.
- Pai? Ele veio até mim e eu o apalpei e perguntei?
- É você papai?
- Sim filha, você demorou! Aqui estou aprendendo como uma criança, começando aprender a escrever. Também participo de aulas, aprendi a orar como Jesus nos ensinou, com a Luz do coração e agradecer com as palavras.
Como temos que agradecer por mais difícil que seja a dor que estamos passando. Há irmãos com dores piores que as nossas. Por mais que o ser humano não entenda a vida verdadeira, devemos nos unir e orar para fazermos da Terra um planeta de paz e amor.
Alguém pode dizer que estamos nos fins dos tempos, mas, estamos começando a viver e entender que Deus é amor, Ele não nos mata! Ele nos faz renascer todos os dias, porque o amor divino é para sempre.
Sempre a tempo de mudar, olhar para o céu, admirar o sol, as estrelas, a natureza e a vida. Você existe porque Deus te ama, mesmo que não entenda a vida plena.
O caminho e as obras de Deus são misteriosos!
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